Itapajé: Prefeita eleita terá que decidir entre continuar com a construção da nova escola Eudes Magalhães ou ratear o precatório



A primeira turma de estudantes formada no Ginásio São Francisco de Assis comemorou sua formatura no ano de 1960. Seis décadas depois a história daquele que já foi o mais prestigiado educandário itapajeense chega ao fim definitivamente com o início dos trabalhos de demolição do prédio.

Anos depois de sua fundação a escola passou à administração da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade e durante décadas integrou a rede de colégios da CNEC.

Em julho de 2019 o prefeito Dimas Cruz assinou decreto de desapropriação do prédio em comum acordo com a instituição mantenedora. O valor da indenização foi de R$ 3 milhões. A escola, cuja estrutura estava muito deteriorada, era a imagem da decadência da CNEC no Ceará, onde inúmeras instituições de ensino estavam em fase de encerramento das atividades ou já as tinham encerrado.

Apesar dos comprometimentos estruturais, a prefeitura manteve por um breve período turmas estudando no local, agora com novo nome: escola professor Francisco Eudes Magalhães, histórico diretor responsável por transformar o colégio, em seus áureos tempos, na maior referência em educação da região.

Em setembro do ano passado a prefeitura realizou licitação para contratação de uma firma para a construção da nova escola professor Eudes Magalhães. O projeto, ambicioso, prevê uma área construída de 4.586,27 m2, com capacidade para 1 mil estudantes em 24 salas de aula climatizadas, amplo estacionamento, laboratório de informática, refeitório com capacidade para 400 pessoas, moderno ginásio poliesportivo, auditório/teatro, além de 2 piscinas. 

A empresa vencedora da licitação, foi a construtora Vetor Obras de Engenharia EIRELI EPP (CNPJ: 28.323.363/0001-87), oferecendo um preço de quase R$ 5,9 milhões.

Na última terça-feira, dia 17 de novembro a empresa iniciou os trabalhos de demolição da antiga estrutura para erguer a nova escola. Ocorre, entretanto, que a continuidade do empreendimento, ou pelo menos sua execução no prazo previsto em contrato, doze meses, ainda é incerta. O atual prefeito, Dr. Dimas Cruz, deixará o cargo no dia 31 de dezembro e a partir de 1º de janeiro de 2021 assume a nova prefeita Dra. Gorete Caetano.

A incerteza reside na fonte de financiamento da obra. Os recursos, vultuosos, segundo a licitação, devem sair do Fundo Municipal da Educação (FME), recursos próprios, em tese. Mas o dinheiro, que hoje está depositado nas contas da Prefeitura, é fruto de pagamento do precatório do Fundef realizado pela União em benefício do município.

Desde a primeira notícia de que o município havia sido vitorioso em ação na Justiça contra o governo federal, no final do ano de 2015, o dinheiro vem sendo alvo de disputas entre professores e a municipalidade. A categoria advoga que o dinheiro deve ser utilizado aos moldes do Fundeb, fundo de financiamento da educação que substituiu o Fundef. A partir deste entendimento os docentes, apoiados pelo sindicato dos servidores municipais, considera que 60% do montante devem ser rateados entre os professores, mas somente entre aqueles que estavam em sala de aula entre os anos de 2001 e 2005, período em que o governo federal repassou ao município valores inferiores aos devidos para financiamento da educação básica, circunstância que motivou a ação. Cerca de 500 pessoas teriam direito ao bolo.

Já o município defende outra tese. O dinheiro seria verba compensatória, já que os recursos para complementar o financiamento da educação básica entre 2001 e 2005 saíram dos cofres públicos, onerando a prefeitura além do que era obrigação do ente municipal. Ou seja, por esse entendimento os professores não teriam direito a nenhum percentual do dinheiro, acrescentando-se que a secretaria da educação não teria deixado de pagar salários no interstício supracitado.

Assim como em Itapajé, outras cidades, em muitos estados, venceram ações judiciais semelhantes contra a União. Em alguns municípios houve acordos extrajudiciais entre as prefeituras e os professores, em outros não. Tramitam na justiça vários processos sobre o assunto. Há decisões conflitantes em instâncias diferentes e muitos consideram que não há segurança jurídica quanto a questão. Já o sindicato assegura que o município pode proceder com o rateio sem impedimentos jurídicos, cita, inclusive, lei municipal promulgada pelo então prefeito Kelsey Forte, no ano de 2016, que autoriza o pagamento.      

A contenda pelo dinheiro do precatório acabou se tornando alvo de disputas políticas. Na campanha eleitoral a então candidata Gorete Caetano assinou um pacto com o sindicato dos servidores de Itapajé comprometendo-se a ratear os recursos com os professores.

Grande parte do dinheiro já foi utilizado na compra de ônibus escolares, reforma e ampliação de escolas, compra de livros, equipamentos para as escolas, etc.

Dos cerca de R$ 33 milhões do recurso inicial – valor acrescido de juros bancários desde o pagamento efetuado pela União até o início de sua utilização – já foram gastos quase R$ 19 milhões, restando pouco mais R$ 14 milhões. Ou seja, caso prospere a tese de que 60% do recurso original deve ser rateado, já se foram R$ 5,7 milhões da parte que é reivindicada pelos educadores.

Não haveria dilema caso as duas partes tivessem chegado a um entendimento ainda quando a integralidade dos recursos estava preservada. Os professores teriam recebido aproximadamente R$ 19,8 milhões, restando R$ 13,2 milhões para o município investir em educação. É obvio que se esse acordo tivesse vingado a prefeitura teria capacidade bem mais reduzida de investir e seria obrigada a optar pelos projetos que considerasse prioritários dentre os já executados e os que estão em vias de execução.

Pelo quadro que se desenha, a prefeita eleita Gorete Caetano terá que escolher entre ratear o que sobrou entre os docentes ou dar continuidade à obra do novo colégio, uma vez que o empreendimento de valor superior a R$ 5,8 milhões não pode ser feito com recursos próprios excluindo-se o dinheiro do precatório. Ademais, será bem difícil (não impossível), em um ano que promete ser muito difícil economicamente, captar recursos dessa monta com órgãos estaduais e federais.

Mas ainda há uma terceira alternativa, de certo bem menos atrativa aos professores. O município poderia financiar a construção da nova escola com parte dos R$ 14 milhões ainda em conta e dividir o restante entre os pleiteantes. Mas a julgar pelo ímpeto com o qual os querelantes estão a clamar pelo quinhão que consideram de direito, é pouco provável que concordassem.

É importante salientar que a futura prefeita terá a prerrogativa de determinar a revisão de contrato e do planilhamento dos valores da obra, mas seja como for, o novo colégio não sai, tão cedo, sem os recursos do precatório. Do outro lado estão os professores, que têm nas mãos um documento assinado pela prefeita eleita. 

Por Mardem Lopes    

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