ARTIGO: Quando a admiração se transforma em fanatismo




No início desta semana, o Brasil foi surpreendido com a operação For All, tocada pela Polícia Federal e pela Receita Federal, que tenta desmontar um esquema milionário de sonegação de impostos. Entre as bandas investigadas está a Aviões do Forró, uma das que atualmente mais fazem sucesso pelo País. Como era de se esperar, o assunto estremeceu a Internet. 



Nas redes sociais, houve quem criticasse o suposto comportamento do grupo, mas houve também quem, por incrível que pareça, defendesse. A seguir, um comentário de um dos fãs de Solange, Xand e companhia: “Com fé em Deus, Sol e Xand não serão presos pelas invejosas PF e Receita Federal. Por que a PF e Receita Federal não investigam e prendem bandidos ao invés de uma banda que está fazendo sucesso com milhões de fãs? Eles não são bandidos, eles são ótimos cantores”. Teve ainda quem argumentasse que o Governo já cobra impostos demais e que quem deixa de pagá-los está mais do que certo. Seria cômico se não fosse trágico. É um tipo de pensamento que reflete como é relativa a postura do brasileiro diante da apropriação indevida de recursos. Bravejam quando um político aparece desviando verba pública, mas contemporizam quando o mesmo acontece com figuras que, de certa forma, compõem seu campo afetivo.


Acabam ignorando que, seja no primeiro caso ou no segundo, tudo é crime e demanda punição. Depois, obviamente, de garantido amplo direito de defesa e comprovados os indícios. É dinheiro que poderia ser investido na educação ou na saúde, em vez de patrocinar o bem-estar de A ou B. Acha a carga tributária do Brasil muito alta? Pois pressione por uma reforma do sistema no lugar de propalar a conivência com o erro. Afinal, se ainda é lei, precisa ser cumprida. É o claro exemplo de como a admiração cega pode desembocar no fanatismo, um fenômeno perigoso independente da área em que ele se manifeste. Na religião, é responsável pelo surgimento do Estado Islâmico no Oriente Médio. Na política, faz com que alguns achem que o ex-presidente Lula é um “Deus intocável”, e que outros acreditem que o PT é o único responsável pela má-fase que o Brasil atravessa. O fanatismo distorce a realidade e alimenta conflitos. Mina o espaço para as ponderações. Aplica regras ao sabor de interesses individuais ou de determinados grupos. Faz esquecer que a Justiça vale para todos.


Ítalo Coriolano

coriolano@opovo.com.br
Jornalista do O POVO

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